quinta-feira, 14 de maio de 2009

Artigo

DESIGN DIGITAL E O MUNDO ELÁSTICO
NOVEMBRO DE 2008 - REVISTA WEBDESIGN Nº 59


De todos os males provocados pelos tempos atuais, acredito que nenhum chame tanto a atenção quanto o enorme desconforto que as novas tecnologias causam nas pessoas. Mesmo que elas sejam as mesmas que permitam enormes evoluções da sociedade. Há cerca de uma década, quem perguntasse “aonde essas coisas vão parar?” certamente teria uma certa idade. Hoje não. Os novos tempos são questionados por velhos de vinte a jovens de oitenta.
E no entanto, são essas mesmas pessoas que usam desapegadamente – e, não há como negar, se informam, se relacionam e se divertem – com o conteúdo informação disponível nas bases de dados da Wikipedia, do Flickr, das mídias sociais, do YouTube. A informação é tanta, e tão acessível, que chega a dar trabalho imaginar um mundo em que a resposta para praticamente qualquer dúvida não estivesse no Google. Um mundo tão esquisito quanto aquele do ano 2000, em que ainda se acreditava que uma revista ou jornal pudessem manter seu conteúdo offline.
Toda época tem seus obstáculos. As tecnologias sempre trazem com suas vantagens um desconforto estranho, uma sensação de deslocamento, de incerteza, de angústia. Por pior que pareça, essa sensação costuma ser um bom sinal. Ela indica que estamos a presenciar uma transformação. Até porque não há opção para a aceleração crescente das coisas. Não faz sentido nenhum parar. Retroceder, menos ainda.
Quem é designer não precisa pensar muito para entender as razões do desconforto. É só lembrar da agonia que teve a primeira vez em que escolher uma família tipográfica para fazer um layout. São tantas as opções disponíveis, algumas delas tão bonitas, que fica difícil escolher. Às vezes é preciso algum tempo de experiência para que se possa desenvolver um critério minimamente razoável. E mesmo assim, a incerteza continua.
Um mundo de abundância é um mundo de escolhas. Quando praticamente tudo é possível, o que faz a diferença não é mais o volume, mas o critério. É isso que os designers modernistas queriam dizer quando proclamavam “less is more”: menos só significa mais quando os elementos escolhidos têm valor. Caso contrário, menos só quer dizer pobre.
O designer precisa se acostumar rapidamente com a mudança dos tempos porque é ele o responsável por definir que cara a inovação terá. Cabe a ele tornar uma novidade estranha – como um serviço online, uma rede social em que pessoas interagem, uma loja em que as mercadorias não são tocadas nem carregadas depois de compradas, uma fonte de informação com infinitas páginas ou um jogo de simulação de mundos – algo que seja compreensível e amigável. Graças a esse tradutor e intérprete do novo que a web, por exemplo, é tão popular.
O design contextualiza, explica e traduz. Esse processo dá um enorme trabalho, a ponto de muitos profissionais de vanguarda tenderem a perder o fôlego muito rapidamente. É tão difícil chegar no topo de uma área de conhecimento que é comum se agarrar a ele e criticar qualquer mudança que apareça, mesmo que faça sentido. Ao longo da minha carreira, vi vários amigos meus caírem nessa armadilha. Eles ficaram velhos e não perceberam.
Mas se é tão fácil se deixar levar pelo mar de novidades, como evitar a estagnação? Minha principal dica é procurar dissecar cada novidade que aparece. Antes de julgar um novo produto ou serviço, não custa nada agir como Leonardo da Vinci, um cientista ou um filósofo grego. Deve-se parar por alguns instantes para observar do que se trata o produto, para que ele serve, como é usado e, principalmente, quem o usa. Em outras palavras, é preciso adotar uma postura flexível.
A aceleração furiosa dos tempos demanda nos profissionais uma elasticidade nunca vista antes. Já não basta ser adaptável, é preciso ter a capacidade de negociar a avalanche de mudanças sem deixar que as novas opções interfiram nos objetivos da marca, do consumidor, da sociedade, do designer. Não é fácil, mas é fundamental abraçar o progresso, entendê-lo e domesticar a inovação. Afinal, como já disse anteriormente, as coisas não vão parar.
E caso você tenha esquecido, você não é uma máquina. Ainda.

Fonte: http://www.luli.com.br/

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